Cena retirada do livro
Deixa Sair, de Sônia Hirsch. "Num terreiro de umbanda, corria a sessão normalmente, quando alguém veio avisar a Pai José que tinha uma velhinha passando mal. Pai José mandou trazer a velhinha - uma senhora pequena, magrinha, de seus 70 anos, com cara de realmente estar nas últimas. Sentaram-na numa cadeira, enquanto Pai José a olhava, media e se concentrava. De repente perguntou baixinho pra ela
Suncê peida, filha? A velhinha, agoniada, olhou em volta pedindo ajuda. Alguém traduziu: "Ele quer saber se a senhora solta gazes!" A velhinha, agoniada que estava, mais ainda ficou. Pai José pediu então para fazer um chá bem forte de dente-de-leão, e, enquanto isso colocou sua mão direita vibrando em direção à barriga da velhinha. Veio o chã, ela bebeu, e momentos depois soltava uma sonoríssima torrente de puns - e sua expressão foi se aliviando, as cores voltando, e ela começou a sorrir para o Pai José. Que sorriu de volta e comentou:
Tem que peidar, né filha? Senào, esse gás aí dentro vai fazer suncê sair voando pelo céu antes da hora....Há muita coisa que a gent põe pra dentro todo dia, depois não deixa sair e ainda reclama: Estou engordando. Meu intestino não funcional. Colesterol alto. Triglicerídios. Glicose alta. Cólicas menstruais horríveis. Pedras nos rins. Catarro nos pulmões. Ai, que dor de cabeça!
Curioso. Porque o nosso corpo é feito justamente para deixar sair, e assim, evitar qualquer doença. A gente faz cocô, xixi, sua, arrota, peida, expira, tosse, chora, menstrua, assoa o nariz, tem orgasmo e outras coisas para se livrar de excessos que, se ficando, perturbam o bom funcionamento físico, mental e espiritual. Aquela tensão na nuca é um excesso que tem que sair. Aquele ideal vibrando no peito um dia tem que sair. Talentos abandonados e apetites mal satisfeitos acabam virando doença.
Vou ler até o final, e aprender. A praticar diariamente o que minha mente já sabe.