terça-feira, janeiro 06, 2009


SAPATINHOS VERMELHOS

Meu sonho até os nove anos foi ter um sapato vermelho. Minha mae, teimosamente, à despeito do meu desejo sincero e dos inúmeros pedidos, não permitia a compra. Sua opinião era de que a cor era imprópria, não era adequada a minha idade, que "eu não tinha querer naquela idade"... Enfim, as justificativas mudavam-se, mas o "não" seguia sendo "não". Um dia, desisti. E lembro que passei ano-de-vontade, o olhar naufragando na vitrine com o sapato...

O tempo passou, fomos para Portugal. E lá, meu pai, que não sabia ainda que a regra na casa era de que 'eu não tinha querer', realizou meu sonho: comprou o sapato vermelho, vermelho carmim, de verniz. Cheio de bolinhas brancas. Ainda tinha uma longa fita de couro fina e vermelha, que me fazia sentir meio heroína quando cruzava a perna com ela. Tudo que eu amava nos meus pés. Esse sapato foi o auê na minha vida.

Com ele nos pés, me senti corajosa, e num ato rebelde, num salão de muitas estrelas em Lisboa, ousei mandar passar a tesoura no cabelo que descia até a cintura. Foi um peso a menos, lá se foi tanto cabelo. Lá se foram todo o choro. Naquele momento eu era feliz. Com meus sapatos vermelhos.

Às vezes basta a realização de uma coisa tão pequena, pra que portas enormes se abram em nossas vidas. Basta um gesto tão singelo, que à primeira vista pareça pouco e mero, para que uma crianca de dez anos comece a achar que "sim, o mundo lhe pertence", inclusive para se abrir e se ver como uma pessoa linda e passível de conquistar um belo principe. Viver algo assim faz a vida conquistar todas as cores. Porque mostra que a gente não precisa ser nada daquilo que não queremos. Mostra que às vezes a porta pode ser aberta por quem nunca teve coragem para tanto; e uma vez aberta, nunca mais ela se fecha, porque a gente escancara... se mostra, se gosta e se predispõe a ser feliz. Pra sempre.

SER. Feliz. Cinza, rosa, vermelha, até com bolinhas. Feliz em todas as cores. Uma vez a cada tom. Saber ser feliz com o presente que nos atém, porque dentro da gente tem algo que não tem cor. Tem aquele negócio que ainda chamam de Amor. Eu gosto de achar que nem palavra possui... aquela coisa de saber que encontrou o que procurou a vida inteira. Como eu um dia vi aquele sapato de verniz vermelho; como eu um dia senti... Nasci assim, sempre sei de certeza o que é pra ser e fazer feliz.

São tantos atos banais, que fazem outros felizes. Gosto, em especial, de como descreve o cotidiano, até mesmo uma situação caótica se torna interessante com sua descrição. Gostaria de ter mesma agilidade e presença de espírito para descrever como as coisas estão aqui, mas vai passar, tudo passa. Os dias tem sido longos, frios, cinzas, por sorte suas poucas palavras os colorem... Estou e ando meio aérea, meio sorrisos, meio voando, meia-asa, sei lá. Ando tão desbaratinada para poder por em palavras o que vai aqui por dentro. Acho que realmente estou aprendendo que o importante antes de tudo é sentir. E sentindo, pronto. A gente começa a gostar de sentir, sentir e sentir. Pra que mesmo palavras? ah, pra me fazerem ficar vermelha quando releio o que já lhe escrevi. Tu não és pra mim um planeta, mas uma constelação.

Com meu parco telescópio tive a oportunidade de contemplá-lo todo este tempo, mas sempre ciente da distância. Abandonar uma rosa nao significa desistir dela. Muito menos estar ausente quer dizer esquecimento. Apenas se vela longe, suavemente. Talvez porque deteste dizer adeus, e prefira até logo, porque tenho certeza. Sei que o destino brinca com a gente. Quero deixar aberta a porta do meu coração pra ti, e o mínimo que espero é uma amizade infinita, já que nada nos condena ou impede disso. Quero sempre estar em contato contigo, se voce permitir. Que mais dizer, dizer o indizível, o indescritível... talvez eu precise ir, depois de tantos NÃOS. Mas de talvez eu não sei; é de certeza o meu ser. A certeza de que você é homem da minha vida.

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