sexta-feira, dezembro 21, 2007


Valeu a Pena.

"Cecília Meireles entendia: Muitas velas, muitos reinos, âncora é outro falar, tempo que navegaremos não se pode calcular... Não é possível derrotar o mar absoluto com os remos que temos nas mãos. É preciso fazer como quem navega: levantar as velas, direcionar o leme, e deixar-se levar pelo vento misterioso da vida...

(...)Valeu à pena?

Tantos rochedos, tantas tempestades, tantas velas rasgadas e recosturadas, tantos mastros quebrados e consertados... Valeu a pena? E eu senti, na sua pergunta, uma outra mais terrível – se não teria sido melhor ter naufragado...

(...)Valeu a pena?

Faz muitos anos eu li o livro Lições de Abismo, de Gustavo Corção. É a história de um homem, nos seus 50 anos, que descobre que tem apenas mais seis meses de vida. Sem tempo para construir o futuro, ele olha para trás, na tentativa de ouvir alguma melodia que se tivesse anunciado em meio às dissonâncias de sua vida. E se perguntava: Valeu a pena? Que bom seria se fôssemos como uma sonata de Mozart, só 20 minutos, mas nesses minutos tudo o que é para ser dito, é dito!

Coitado! Ele não percebeu que a vida de alguém não se mede pelo número de anos vividos, da mesma forma como a beleza não pode ser medida pela duração da melodia. Beethoven disse tudo o que era para ser dito em 50 minutos. Mozart dizia o essencial em 20 minutos. E Milton Nascimento faz a mesma coisa em quatro minutos. A Adélia Prado precisa apenas de 30 segundos.

Blake dizia que a eternidade mora num grão de areia e pode ser contida na palma da mão. Com o que Borges concorda: A vida é feita de momentos.

Valeu a pena?

A sua pergunta está respondida nos curtos momentos da Nona Sinfonia. Curtos, mas destinados à eternidade. Cada momento de alegria, cada instante efêmero de beleza, cada minuto de amor, são razões suficientes para uma vida inteira. A beleza de um único momento eterno vale a pena de todos os sofrimentos.

agradeço à vida, que me deu tanto,
me deu riso e me deu pranto...

Violeta Parra, Chile.

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Rubem Alves, Teologia do Cotidiano

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