terça-feira, agosto 07, 2007


SKIDAMARINK.

Entrou no local, perdida em devaneios. Nada jamais é inofensivo, nem sempre percebemos corretamente a repercussão dos nossos atos. É, era preciso que ele se desse conta disso, antes de ter partido. Tudo bem, os dois acabavam de viver uma lua-de-mel de dois dias, como se estivessem sozinhos no mundo, sem qualquer referencial, mas essa era uma ilusão perigosa, estava ciente disso. Claro que era preciso mais tempo para que o amor recém-nascido se apoiasse em bases sólidas. Bateu o joelho em uma mesa, tropeçou na cadeira antes de sentar... A verdade é que havia perdido totalmente o prumo, atropelada por algo de cuja existência sequer suspeitava. Por outro lado, ainda flutuava em sua nuvem, mas enfim... nutria mágoas por ele ter mentido. Ele era casado! Ou quase...ah, tudo a mesma coisa. Levou um susto quando Ele pôs a mão em seu ombro, e a tirou de seu mundo particular. Quanto tempo fazia que não se via nos olhos dele?

- Oi.
- Oi...
(...)
- É. Acho que nos jogamos nos braços um do outro meio sem pensar.
- Queimamos etapas, é isso? Não conheço você realmente, e muito menos você a mim.
- Mas se você vier pra cá...
- Ah, tudo bem, captei a mensagem. Se eu vier pra sua cidade, se você estiver a fim de se divertir, seria legal a gente se ver.
- Não foi isso que eu quis dizer.
- Esqueça.
- Achei que as regras estavam claras...
- FODAM-SE SUAS REGRAS!


Ela levantou-se bruscamente, a xícara de café voou, esborrachando-se no chão. Andava rápido, cortando a frente da multidão, que reclamava em coro. No fundo, sabia que ele tinha razão. Dois dias de romance não eram suficientes para construir uma relação. Claro que a magia de uma paixão não pressagiava a compatibilidade a longo prazo entre duas criaturas. Corria de cabeça baixa, perdida em reflexões, e na sua mágoa. De repente, errou de direção, tornou a voltar e, por engano, pegou uma escada rolante no sentido inverso. Já sentia que esse era o pior dia de sua vida. Distraída, respirou fundo para acalmar as palpitações. Não sabia mais onde estava, sentou em uma mesa na primeira doceria que viu, pediu um café. Nesse momento sentiu um desejo: reencontrá-lo. Mas precisava ser forte. Dali em diante faria como todo mundo - vida regrada, morna, contando as calorias, tomando café sem cafeína, comendo comida natural, se exercitando todo dia durante meia hora. Não seja boba, não se entregue a um cara que não quer você. Esse cara não a ama, não moveu um dedo para fazer você ficar. Exausta, cansou de reprimir a vida que existia dentro dela, e as lágrimas começaram a cair. Maldita vida equilibrada, amanhã eu tento você!

Foi somente no instante em que Ela se foi, e o café desabou no granito do piso, que Ele entendeu como a tinha magoado. Saiu lentamente dali, como se não tivesse mais energia. Ora, não havia lugar em sua vida para Ela. Afinal, essa história não poderia levá-lo para lugar algum. Depois, havia a sua mentira, e o peso de um passado não superado. No entanto, era preciso admitir - aqueles dois dias tinham mudado sua vida. Alguma coisa dentro dele se soltara. Finalmente, sentia-se liberado daquela angústia surda que o acompanhava desde a infância. Quando se preparava para ir embora, uma força misteriosa o grudou ali. Não, não podia deixar passar essa oportunidade. Se Ela fosse embora agora, ele se arrependeria por toda a vida. Voltou, andando como um desatinado, há muito se considerava acima dos ímpetos da paixão e da dor da perda, mas não era nada disso. O amor lhe metia medo ao mesmo tempo em que o atraía e, como nunca, tinha fome de viver e esquecer todos os antigos temores. Pela primeira vez, acreditava que isso fosse possível, graças a uma mulher que, 48 horas atrás, tinha lhe tocado profundamente, e não sabia como nem porquê. Seria a última esperança de um homem desesperançado? Enquanto andava, pensava que não podia voltar atrás, não queria recomeçar porque não sabia se podia mais parar, sempre foi forte ia continuar sendo. E revia o rosto dela, seu perfume, seu jeito de sorrir, a fagulha de vida que a acompanhava. Dobrou a esquina, pra espantar as lembranças, cruzou a rua, pra evitar se afogar no rosto que lhe tomava a mente, e entrou no primeiro café que viu, pra tentar se salvar de tanta dor que o afligia. Abriu caminho e, no fundo do salão, a viu. Se Albert Cohen estivesse ali, teria escrito "Foi no espaço de um abrir e fechar de de olhos, e Ela olhou para mim sem me ver, e foi a glória, a primavera, o sol e o mar tépido..." para esse momento. Quando seus olhos se encontraram novamente, foi tal como uma confirmação tácita, que misteriosamente declarava que 48horas de amor sempre prenunciavam o início de uma vida. Mesmo que um dos dois perseguisse o fim por algum tempo. Sorrindo, sentou ao seu lado. Num átimo, pegou sua mão, e lhe disse que iria provar que podia segurar sua mão com mais força quando ela resolvesse ir embora. Pra evitar outra xícara de café no chão, menina.

O QUE VALE É SEMPRE A ÚLTIMA VOLTA.

:::

*Ajuda do Guillaume Musso, SOCORRO! Este romance é perigoso, manipula nossa mente e nos faz transbordar o que, aqui e o que vai além...

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial