terça-feira, agosto 14, 2007


Codornas em pétalas de rosa.


INGREDIENTES:
12 rosas, de preferência vermelhas
12 castanhas
Duas colheres de manteiga
Duas colheres de fécula de milho
Duas gotas de essência de rosas
Duas colheres de anis
Duas colheres de mel
Dois alhos
6 codornizes
uma pitada de sal

MODO DE FAZER:
Desprendem se com muito cuidado as pétalas das rosas, procurando não picar os dedos, pois além de ser muito doloroso (picar se), as pétalas podem ficar impregnadas de sangue e isto, além de alterar o sabor do prato, pode provocar reacções químicas, muitíssimo perigosas. Mas Tita era incapaz de se lembrar deste pequeno pornenor perante a intensa emoção que sentira ao receber um ramo de rosas, das mãos de Pedro. A única coisa que nesse momento tinham era codornizes, e então decidiu alterar ligeiramente a receita, o que importava era utilizar as flores. Sem pensar duas vezes saiu para o pátio e dedicou se a perseguir codornizes, Depois de apanhar seis meteu as na cozinha e preparou se para as matar, o que não lhe era nada fácil depois de =as ter cuidado e alimentado durante tanto tempo. Com uma profunda inspiração, agarrou na primeira e torceu lhe o pescoço como tinha visto Nacha fazer tantas vezes, mas com tão pouca força que a pobre codorniz não morreu, em vez =disso foi se queixando penosamente por toda a cozinha, com a cabeça pendurada de lado. Esta imagem horrorizou a! Compreendeu que não se podia ser fraco nisto da matança: ou se fazia com firmeza ou só se causava uma grande dor. Nesse momento pensou em como seria bom ter a força da Mamãe Elena. Ela matava assim, de um golpe, sem piedade. Bom, ainda que pensando bem, não. Com ela tinha feito uma exceção, começara a matá la desde pequenina, pouco a pouco, e ainda não lhe dera o golpe final. O casamento de Pedro e Rosaura deixara a como à codorniz, com a cabeça e a alma fraturadas e antes de permitir que a codorniz sentisse as mesmas dores que ela, num ato de piedade, com grande decisão, rapidamente acabou com ela. Com as outras foi tudo mais fácil. Só procurava imaginar que cada uma das codornizes tinha um ovo quente engasgado no bucho e que ela piedosamente as libertava desse martírio dando lhes uma boa torcidela. Quando era pequena, muitas vezes desejou morrer para não ter de comer o famoso e obrigatório ovo quente. A Mamãe Elena obrigava a a comê lo. Ela sentia que o seu esôfago se fechava todo, com muita força, incapaz de conseguir deglutir qualquer alimento, até que a mãe lhe dava um murro na cabeça que tinha o efeito milagroso de lhe desfazer o nó na garganta, por onde o ovo deslizava então sem qualquer problema. Agora sentia se mais calma e os passos seguintes foram executados com grande destreza.

Depois de depenadas e esvaziadas, agarra se nas patas das codornizes e atam se, para que se conservem numa posição graciosa =enquanto se põem a dourar na manteiga, polvilhadas com pimenta e sal a gosto. É importante depenar as codornizes em seco, pois molhá las em água a ferver altera o sabor da carne. Este é um dos inúmeros segredos da cozinha que só se adquirem com a prática. As rosas conferem lhe um sabor refinadíssimo. Depois de se desfolhar as pétalas moem se no almofariz juntamente com o anis. À parte, põem se a dourar as castanhas no comal, previamente descascadas e cozidas na água. Depois, fazem se em puré. Os alhos são finamente picados e alouram se na manteiga; quando já estão louros junta se lhes o puré das =castanhas, a pimenta moída, o mel, as pétalas de rosa e sal a gosto. Para que o molho fique um pouco mais =espesso podem juntar se lhe duas colherzinhas de fécula de milho. Por último, passa se por um tamis e juntam se lhe só duas gotas de essência de rosas, não mais, pois corre se o perigo de ficar demasiado perfumado e estragar o sabor. Assim que estiver apurado retira se do lume. As codornizes só se mergulham durante dez minutos neste molho para que se impregnem do sabor e retiram se. O aroma da essência de rosas é tão penetrante que o almofariz que se utilizava para moer as pétalas ficava impregnado durante vários dias.

(...) fundiram se imediatamente de uma tal maneira que quem os tivesse visto só teria notado um único olhar, um único movimento rítmico e sensual, uma única respiração agitada e um mesmo desejo. Permaneceram em êxtase amoroso até que Pedro baixou a vista e a cravou nos seios de Tita. Esta deixou de moer, endireitou se e orgulhosamente ergueu o peito, para que Pedro o observasse plenamente. O exame de que foi objeto mudou para sempre a relação entre eles. Depois desse perscrutante olhar que penetrava a roupa já nada voltaria a ser igual. Tita soube na própria carne por que é que o contato com o fogo altera os elementos, por que é que um bocado de massa se converte em pão, por que é que um peito sem ter passado pelo fogo do amor é um peito inerte, uma bola de massa sem qualquer utilidade. Em apenas alguns instantes Pedro tinha transformado os seios de Tita de castos em voluptuosos, sem precisar de lhes tocar. Se não tivesse sido a chegada de Chencha, que tinha ido ao mercado buscar chiles anchos, quem sabe o que teria acontecido entre Pedro e Tita; talvez Pedro tivesse acabado por amassar sem descanso os seios que Tita lhe oferecia, mas, infelizmente, não foi assim (...)

Laura Esquivel, Como Água para chocolate. Filme e livro ótimo.

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