domingo, abril 23, 2006


Pepper:.


O homem da minha história ainda não tem nome - ele mesmo não se define. Em dias claros, posso ve-lo como um pescador, talvez pela lembrança do livro "O velho e o Mar", e a sua eterna perseverança e paciência na colheita daquilo que era impossível... Quando há muita nuvem, e pouca visibilidade, é como esse peixe, enclausurado, imaginando-se em clarabóias... quando muito, vivendo em aquários. No frio, uma pimenta, não pela cor, mas pelo sabor, levemente picante, forte, com compostos escondidos em armários, como a piperina. Já valeu no apogeu do Meu País, muitas e muitas gramas de ouro, e hoje, o que ele vale é toda a minha vida... a valorização foi imensa nesse período. O problema do meu amor é seu disfarce: ele sabe como se mesclar aos outros, e em nenhum momento aqueles que não distinguem qualidade de quantidade saberão que por ali anda exemplar raríssimo, desses que são capazes de nos alimentar, e ainda nos rejuvenescer, impedindo nossa decomposição por meios variados, que aqui não posso detalhar... Seria estranho e altamente impeditivo para a minha crença falar em comida, paixão e conservas, assim, de modo tão aberto e público...


O que me preocupa, na verdade, neste exato momento dessa madrugada, em algum lugar do país, é que, sabendo eu ser como a especiaria raríssima chamada açafrão, originária do Mar mediterrâneo, extraída da variedade de Crocus sativus, pó de cor avermelhada, sendo atualmente a mais cara do mundo, uma vez que para minha composição são necessárias muitas e muitas gramas de milhares de estigmas de flores desta planta correta... Será que sou eu o condimento certo para esse homem maravilhoso? Homem-de-muitas-faces: pimenta-do-reino, peixe no aquário ou pescador em Salvador... Eu, que exigo tanta profundidade, a vida da pessoa e o sangue no corre-corre do dia, no cotidiano dependuro-o de cabeça pra baixo, numa sucessão infinita de alta rotação... Talvez daí advenha o medo de que este Homem-Amor, meu peixe-querido não seja assim tão resistente, quem sabe é da espécie beta-que-morrem-quando-chegam-na-sua-casa-após-a-exposição, e então, diante disso, Ele, o meu Amor-além-da-vida, resolva se contentar com algo mais simples, como a substituta especiaria, a idiota do açafrão indiano ou da terra, com efeito parecido para aqueles que não sabem oq ue comem, e muito, mas muito mais barato, porque não exige interior, é tudo exteriormente ali... Cópia pirata. E mais: segura, porque vem junto o sofá, chinelo e televisão de 29 polegadas. Comigo, no máximo, uma corda pra você pendurar na árvore mais alta, e fazer o nosso balanço, de amor, cheiro e comida. Pro que der e vier...Como diria Drummond, Existem muitos motivos para não se amar uma pessoa, mas apenas um para amá-la... Eu que já achei esse um, temo pelos montes de motivos existentes na minha vida para abafar o um que não sei se já conseguiu enxergar, em meio a névoa, trovoada e tempestade...

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Mais? Ainda choro pela minha cachorra, pelas criancas-vizinhas que a furtaram da minha casa, recém-vinda do Pet Shop (sim, o preço do pacote mensal era caro!), eu adorava aquela baforenta que me lambia a cara e dormia embaixo da minha cama... Não fiz a colheita do sangue dela, nem identidade canina, então como provar que as crianças que eu vi no portão da minha casa, e moradoras-inquilinas duas quadras abaixo, são as donas e não eu? Sei, nem mesmo a super maravilhosa e fantástica advogada que há em mim é capaz de ir além da ética e do amor... pelas crianças. A perda foi um rombo no meu coração, mas a pimenta cura. Quanto ao homem que detém muitas peças, não, nem tentem... Pode ser a menor-abandonada, eu já aviso: sou expert em quebra-cabeças de 5.000 peças. E nada, mas nada, leva embora o que é do meu caminho e da minha vida. Por merecimento e dignidade. Além da vida, Por Amor.

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Pra termintar, minha irmã liga: querida, não esquece ninguém dentro do carro. Não esquece de buscar na escolinha. Não esquece... Ei, quem tem a Sindrome da Gerbera laranja não sou eu. Tudo bem, já esqueci muitas coisas... mas foram esquecimentos que tinham justificativas - lógico que impossíveis de falar para os esquecidos... A gérbera que segure o talo!

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