domingo, agosto 21, 2005


O navio da Alvorada:.

"Tinha sabido demonstrar meu amor por minha mulher? Talvez durante um período, mas nem sempre. Por que? Porque ele achava que não era necessário, ela devia saber, ela não podia colocar em dúvida seus sentimentos. Lembrou-se que, muitos anos atrás, alguém lhe perguntou o que tinham em comum todas as namoradas que passaram em sua vida. A resposta foi fácil: ELE. E ao perceber isso, viu o tempo que tinha perdido na busca da pessoa certa - as mulheres mudavam, ele permanecia o mesmo, e não aproveitava nada do que viveram juntos. Teve muitas namoradas, mas sempre esperou a pessoa certa. Controlou, foi controlado, e o relacionamento não passou disso - até que chegou Esther, e transformou o panorama por completo. Estava pensando em suas ex-mulheres com ternura: já não era mais uma obsessão controlá-la, saber porque tinha desaparecido sem explicações. Embora "tempo de rasgar, tempo de costurar" fosse um verdadeiro tratado sobre seu casamento, o livro era sobretudo um atestado que passava para si mesmo: era capaz de amar, de sentir falta de alguém. Esther merecia muito mais do que palavras; mesmo as palavras, as simples palavras, jamais tinham sido ditas enquanto estavam juntos. Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final. Encerrando ciclos, fechando portas, terminando capítulos - não importa o nome que damos, o que importa é deixar no passado os momentos da vida que já se acabaram. Pouco a pouco, começou a entender que não podia voltar para trás, e refazer as coisas, fazer as coisas voltarem a ser como eram: aquele ano sem Esther, que parecia antes um inferno sem fim, agora começava a mostrar seu verdadeiro significado. E esse significado ia muito além do seu casamento: todo homem, toda mulher estão conectados com a energia que muitos chamam de amor, mas que na verdade é a matéria-prima com a qual o Universo foi construído. Essa energia não pode ser manipulada - é ela que nos conduz suavemente, é nela que reside todo o nosso aprendizado nesta vida. Se tentamos orientá-la para o que queremos, terminamos desesperados, frustrados, iludidos - porque ela é livre e selvagem, e passaremos o resto da vida falando que amamos tal pessoa ou tal coisa, quando na verdade estivemos apenas sofrendo, porque, ao invés de aceitar sua força, tentamos diminuí-la, para que coubesse no mundo que imaginamos viver."*

O amor não precisa de palavras, mas necessita de uma base única: confiança. Quando esta se destrói, o que temos é o recomeço. Leva-se tempo...Sinto que no momento há forças me impelindo para outro país, Tempo de migrar para o Norte. Nessa bifurcação, escolho a vida, logo eu, que no afã de prosseguir, jamais decidi ou escolhi, apenas deixava tudo em mãos alheias. Escolho a vida porque existem pessoas aqui que gostaria ainda de desfrutar muito tempo ao lado delas. Porque tenho deveres a cumprir, e sonhos a realizar. Porque ainda há um sentido, e o caminho não está findo. Sou capaz de perdoar, porque sou capaz de esquecer. E logo, a neblina passará, e passarei a andar com força e argúcia, diante das dificuldades presentes erguerei meus olhos e ouvirei a resposta de Tmaina ao vento. É tempo de migração, porque o tempo do impasse e da dúvida se instalaram - e o tempo do desespero trota rapido, destemido, crente que possa eu estar a seu alcance. Mas o resgate da esperança me concedeu tempo suficiente para prosseguir em paz. Agora não tenho mais a sensação de ser apenas uma pena ao vento, sou muito mais como o velho limoeiro, criatura que todos os dias me saúda, e que possui origem, raiz e objetivo.

*Trecho de Zahir, Paulo Coelho

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