domingo, julho 31, 2005


SeferLove:.

amore maiuscullo

Aqui se conta, aqui se narra. Mais uma história, transcrita dos livros de Amor de Palova, e como todas ali, não requer e nem depende de crédito, crê quem quer. Sussurra-se pelos vãos das letras, suavemente, respeito para com seu teor, pois todas são folhas cheias de sentimentos.

Parto do começo. Resolvo cortar algumas partes, afinal ali coisas que não tem pé, nem possui cabeça, é de uma ilógica ululante, pelo menos para mim, fria e racional. Onde mais dois palitos de fósforos que estavam transbordando numa caixa imensa, de repente se olham, e se amam, assim, do nada, sem tempo e sem enganos? Magia? Era tudo o que podia ser. Para ela, donzela sonhadora, parece que viveu o sempre-depois, e o nunca-exercido, de olhares que se cruzaram, dizendo e adivinhando um tudo que não precisou de constatação para ser vivido - apenas para morrer em si. Porque há sempre uma perda em cada encontro. Deslumbrada, encontrou o que queria, e de repente ficou melancólica inexplicavelmente, porque o encontro veio carregado de experiências e desencontros anteriores. E perto desse alguém que demorou tanto tempo buscando, de repente sentiu-se muda, não conseguindo expressar o que lhe vinha na alma. Perda, porque de repente houve um corte, e a não-realização de tantos afetos! A idéia do amanhã, cheio de interrogações. O sonho do supermercado, as mãos dadas em passeios pela cidade... De tudo o que ficou foi uma saudade antecipada. Quando aqueles que amamos - mesmo que por um momento, parte, tudo o que nos resta é o brilho de seus olhos. Para além da memória, é a única recordação que retenho. Loucura: se esse sentimento não engolir a dita moça inteira, creio que um dia as garras em torno de seu pescoço sejam abrandadas. Mas é preciso que alguma coisa, alguém a ajude a se livrar de tal fulgor. Se pudesse, lhe diria que "deveria forçar o caminho para sua vida, à procura de recuperar o seu". Nesse encontro, há de um lado, um homem. Moreno, ou quem sabe na verdade, mascarado, e por baixo de tantas camadas, ali se esconda um lez traquinas. Chama a atenção não pela beleza, pois esta é quase inexpressiva, mas pelas qualidades que lhe afloram logo que se coloca a falar. Calmo, ponderado, solícito, afável. Inteligente. Arrebatador. Sossegado, amante de chuva e devoto de São Francisco de Assis. Leitor contumaz de Monteiro Lobato, cheio de palavras de amor, de dedicação, proteção e compromisso. De paragens longínquas, perdido por ali. A moça: um ser humano como sempre desejara ser, pois nunca quis só "estar". Vulnerável, complicada, amorosa. Cheia de erros, falhas, fobias e muitas manias, apreciadora de laços e afetos. Perspicaz, muitas vezes muito sincera e verdadeira, desse modo atingindo e machucando muitos do que amava. Certamente, muitas vezes sem razão. Dois seres que, pela semelhança, se incendiaram; e pela crueldade, um sentimento foi pisoteado. Dos dias açucarados, como todo começo de conquista, passaram-se há semanas prostrados e fatigados por intermináveis conversas sobre eles. Cada um conhecendo melhor o outro, numa leva de chuva e sol, onde prometiam tenazmente proteger o sentimento que neles já habitava. A mocinha da história lembrava de cada uma de suas vãs e afoitas promessas: "Nunca mais sairei sem você, meu amor". Ou ainda: "Eu te amo, acredite". À noite, revivia cada palavra, e ainda não entendia de que era feito esse tipo de amor-estilo-homem-yakult, que se vai com um vento, e volta mascarado, pra lhe assustar em noites chuvosas. Talvez tenha sido a falta do iogurte na geladeira que fez o romance esvair-se pelo ralo de um aeroporto. Suas batalhas moralizantes, travadas em silêncio, durante trajeto de carro, seus olhares de condenação tão fechados como as grades dessa paixão, são vestígios que nunca mais irão se perder da mente dessa bela donzela. A distância dele cava ainda sulcos profundos dentro dela, e pela madrugada, dá-se conta que seus principais galhos foram cortados brutalmente. Agora, só lhe resta, a partir das cicatrizes, lançar galhos novos, alçar o melhor que puder, florescer até. Mas parar de olhar para trás.

Numa tarde de chuva, muito frio e nuvens trouxeram lágrimas a seus olhos. Decidiu colocar para fora o que guardava há tempo em seu baú de mágoas. Para que fossem verdadeiras as linhas de uma história ainda marcante, bateu em si como quem bate a uma porta, num modo desconcertante de dizer que era necessário silêncio para contar o que ficou entalado, sempre em busca de uma resposta que jamais adveio. E de uma realidade sincera. Da mesma maneira como foi ferida, num local de onde ainda brotavam inflamações dolorosas, reconheceu junto todos os seus pequenos dramas humanos, que poderiam ser contabilizados em infindáveis cadernos. Nos seus afetos houve muitos momentos hilariantes, e não duvidem de lágrimas em demasia também. Porém, nesta insólita vez, quando pensou que haveria uma celebração, houve sim uma rata, fiasco nefasto. Quando imaginou um encontro, foi solidão o que encontrou. E quando, no auge de seu desespero, pediu um abraço e uma segunda chance, foi punida e segregada. Se essa história-de-dois houve momentos bons, foi porque muito do que se realizou foi além de todas as expectativas. Quem sabe por isso ainda doa tanto comentar sobre o ocorrido? O que espera, a moça, ao colocar no papel essa sua história de Amor? Que a tempestade se acalme, e surja diante de si uma memória de esperança, amor e lealdade - Neshama

Ele, perfeito cavalheiro: abria a porta do carro, ligava sem marcar horário - sabia sempre ser uma grata surpresa, tendo as palavras certas nas horas exatas. O bom humor contagiante era alguém que estava apaixonado, ou pelo menos encenava isso. Mais poderoso do que o pensamento de proteger-se que a linda moça carregava dentro de si, foi o sentimento arrebatador, que permitiu deixar-lhe a guarda aberta. Foi a Ele que se entregou como nunca havia feito: sem pés atrás, sem mentiras, inteiramente. Quando o final chegou, por telefone e sem qualquer emoção em sua voz, ela deixou-se caminhar ao vento, carregando todo o amor que cultivara como um filho de seu próprio interior. Filho nascido do riso e agora da mágoa, da cólera e da ternura, de tantos medos e muitos sonhos. Pedia a Deus que a ajudasse a renunciar a isso: a toda essa emoção que transbordava dentro dela, possuindo seus recônditos mais íntimos, criando raízes profundas em seus pensamentos e não lhe deixando nem paz para seguir com seu espírito. Que lhe desatasse os nós, lhe extinguisse parte de si, para que dentro pudesse abrir uma porta e fazer sair aquilo que jazia ali, enorme e crescente. Em todas as palavras daquele homem, ela acreditou. Poderia uma máscara ser mais do que uma metáfora, um adorno verdadeiro? Quantos eus deste homem, que dormira abraçado a ela, não conhecera? A sua sombra e a sua luz seriam seus maiores paradoxos - e talvez para sempre ensimesmados em si próprio. Certa vez prometeram-se jamais usar máscaras. Não haveria mentiras entre os dois. E todo mal entendido seria consertado, instantaneamente. Mas qual o quê, o que acabou acontecendo terminou por deixar a moça na escuridão, não reconhecendo aquele por quem se apaixonou de sofreguidão. Temia por bater em sua porta interior, e ali encontrar a resposta de que sim, ela poderia ter criado um fim para esse destino. Um final diferente. Como? Era o que por várias noites se perguntava, balançando-se de trás para frente, como se nessa posição conseguisse buscar consolo na graça do seu próprio movimento, ante o desamparo e a solidão que lhe acolhia. Seria possível que o objetivo de uma conquista fosse surgir na vida de alguém, e inesperadamente, no espaço de um único momento, fechar a chave todas as portas de retorno? Entre eles existira rara sensibilidade, gosto refinado e ao mesmo tempo simples e real. Simetrias e coincidências: amavam tanta coisa em conjunto, queriam a mesma reta para o fim. Para ela não havia acasos nem coincidências: tudo tinha um significado. Justo ela, sempre com medo de dar o primeiro passo, sempre tão temerosa, como se o mundo fosse uma escada íngreme e a qualquer momento pudesse despencar das alturas, ousou e perdeu. Sem poder decifrar o que havia feito de errado. A culpa poderia cair nessa vida, feita de padrões definidos e perceptíveis: quem sabe ela não fosse magra o suficiente, inteligente o bastante, rica como exigia, culta como ele queria? Tantas questões sem resposta, e não porque não tivesse perguntas - o que não houve foi retorno. O que ficou foram muitas veredas, que não a levavam a parte alguma, portas que se abriam para abismos, portões fechados a cadeado. Sua parte recuada se deu conta que não havia mais esperança. Aquele homem fora uma ilusão, e disso não adiantava fugir. O que tinha a fazer era consolar-se, e distanciar-se, para poder esquecer. A resposta do desaparecimento surgia: ela tinha que esquecer e apagar qualquer vestígio de sentimento, pra poder recomeçar. Talvez o grande problema tenha sido sua carência, que na época da chegada dele estava no auge.

Linha após linha, fato após fato - ligou todas as pistas entre si - as que ele deixava entrelinhas e aquelas que conhecia, e resolveu enfrentar a verdade, até formar um verso facilmente inteligível: " Caia fora, não te quero" foi o que ela viu nos seus atos e palavras. Foi fácil de entender, tão díficil e dolorido de aceitar. Pelo menos agora estava no papel. Doeu, sofreu, chorou, mas ela obteve uma resposta. E sabia, através de um sonho, que as promessas que ele quebrara, por vaidade, traição ou mero desinteresse, haveriam de constituir a cola que ainda selaria suas vidas, mais tarde. Era um sacrifício ficar longe dele, mas optou por renunciar ao pouco que agora ele lhe dispunha, a ter que se contentar com um nada falso. Aprendera que os atos são muito mais importantes do que todas as palavras reunidas, e não haveria coleção de dicionários suficiente que se comparasse a delicadeza de um gesto sincero, de um homem que sabia começar e terminar relações que envolviam sentimentos. Nada, nem pactos secretos, nem orações sussurradas ao relento, eram algo perto de atenção e carinho para com o coração do outro. Quem um dia sofreu por amor sabe o quanto dói ser deixada na estrada, sem saber qual destino ir, e onde o ônibus irá chegar. Não há como destacar ou escrutinar os momentos: falar dos beijos, abraços, sorrisos e mãos juntas seria redundante. Todo casal que já se amou passa por isso. Por mais que ela pense que percebera a verdadeira forma do acontecimento, e tivesse dentro de si a lição deste acontecimento na sua vida, ainda não conseguia engoli-lo. Ele estava ali, em brasas, queimando-a por dentro. Com o tempo, haveria uma maneira de rasgar as roupagens que revestiam os momentos, e quem sabe, revelar-se-iam novas camadas interiores? Não, não havia esperanças, apenas procurava se lembrar dele como uma safira de amor, lançada em seu mundo, por algum Deus Desatinado. Ou quem sabe Abençoado, pois foi nos seus braços que conheceu a graça de dormir em paz.

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DestinoA história continua: no livro de amor de Palova prossegue ditando palavras mais fortes, e muitas vezes destila veneno. Achei prudente uma parada, pois as páginas me empurravam vertiginosamente, como uma corrente, para frente, sem meditar nas conseqüências. Tal como uma cigana, contra o Oceano eu não luto. Apenas me entrego. Porque o que é meu as ondas trazem a meus pés; porque a falta que um certo e inexplicável amor faz, nenhum demônio, mesmo judaico, supera.

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